Depois de dar um calote de quase R$ 10 bilhões ao Brasil, valor ligado ao Fundo de Garantia à Exportação (FGE) e à inadimplência prolongada em contratos públicos de comércio exterior, o governo de Nicolás Maduro resolveu agravar ainda mais a relação bilateral. Sem qualquer aviso, diálogo ou negociação, a Venezuela decidiu impor tarifas que variam de 15% a 77% sobre produtos brasileiros, mesmo nos casos em que, por tratado, a importação deveria ser isenta mediante apresentação do certificado de origem.
O movimento escancarou a falta de compromisso com os acordos em vigor e trouxe revolta a empresários e exportadores que agora enfrentam novas barreiras nas indústrias para vender seus produtos no país vizinho.
A decisão surpreendeu até mesmo as autoridades diplomáticas brasileiras. Conforme divulgado pela imprensa de Roraima e confirmado pela Federação das Indústrias do Estado de Roraima (FIER), os certificados de origem dos produtos brasileiros estão sendo simplesmente ignorados pelas autoridades venezuelanas, o que tem servido de pretexto para a cobrança das alíquotas abusivas.
Tarifaço inesperado e clima de incerteza
Agora, além de não pagar a divida bilionária ao Brasil, Maduro ainda impõe tarifas que podem quebrar exportadores brasileiros. Na prática, a medida funciona como um duro golpe contra a indústria brasileira, uma atitude que muitos classificam como provocativa e ofensiva.
A cobrança de imposto sobre os produtos brasileiros começou a ser denunciada nos últimos dias por empresários e entidades de classe em Roraima. Embora exista um Acordo de Complementação Econômica entre Brasil e Venezuela, o ACE nº 69, firmado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), que garante isenção tarifária para a maioria dos itens, os exportadores se depararam com uma nova realidade: alíquotas entre 15% e 77%, aplicadas mesmo com certificado de origem válido.
A notícia foi inicialmente publicada pelo jornal Folha de Boa Vista e confirmada pela Federação das Indústrias do Estado de Roraima (FIER), que agora tenta entender se houve um erro técnico ou se a decisão partiu intencionalmente do governo de Nicolás Maduro.
Exportadores à deriva, fronteira em alerta
Quem sente no bolso são os empresários que dependem da exportação de produtos brasileiros para manter seus negócios. Com a Venezuela sendo o principal parceiro comercial de Roraima, qualquer encarecimento nos custos pode tornar os produtos inviáveis frente à concorrência.
“O Governo do Estado de Roraima, sob a liderança do governador Antônio Denarium, acompanha com grande preocupação as informações sobre a elevação da alíquota do imposto Ad Valorem por parte do governo venezuelano, que atinge diretamente produtos de origem brasileira exportados por Roraima”, diz a nota oficial divulgada pelo governo estadual na sexta-feira, 25 de julho.
Segundo os dados mais recentes do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), de janeiro a junho de 2025, Roraima exportou US$ 41,5 milhões para a Venezuela, concentrados principalmente em alimentos, óleos vegetais e animais vivos. No total de 2024, as exportações brasileiras ao país vizinho somaram US$ 1,19 bilhão — o equivalente a 0,4% do total nacional.
Indústria de Roraima reage com mobilização
A indústria de Roraima não ficou parada. O Centro Internacional de Negócios da FIER iniciou apurações internas para descobrir o motivo da rejeição dos certificados de origem por parte das autoridades venezuelanas. Em nota, a federação informou que:
“Está em contato direto com as autoridades competentes do Brasil e da Venezuela, em busca de esclarecimentos e soluções rápidas que visem a normalização do fluxo comercial bilateral.”
A entidade também afirmou que todos os procedimentos adotados pelas empresas brasileiras estão em conformidade com o tratado da ALADI, e que não houve mudança nos trâmites por parte do Brasil.
Governo federal entra em cena, mas sem respostas concretas
No plano federal, o impacto da medida foi reconhecido, mas ainda sem uma solução efetiva. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, comandado por Geraldo Alckmin, divulgou uma nota confirmando que recebeu relatos sobre a situação e que está em diálogo com o Itamaraty e com a Embaixada do Brasil em Caracas, que, por sua vez, já entrou em contato com representantes venezuelanos.
“O MDIC está em diálogo com representantes do setor produtivo para reunir informações mais detalhadas sobre os casos reportados”, informou a pasta.
Ainda assim, não houve até agora uma posição oficial do governo venezuelano justificando a decisão ou sinalizando que as tarifas serão revistas. Enquanto isso, os prejuízos seguem se acumulando, e a dívida diplomática entre os dois países só aumenta.
Indústrias de Roraima realizam mais de 70% de suas exportações para o país vizinho
A relação comercial entre Brasil e Venezuela, especialmente com os estados da região Norte, sempre foi vista como estratégica. Roraima, por exemplo, realiza mais de 70% de suas exportações para o país vizinho, e a nova política tarifária, se mantida, pode abalar duramente essa engrenagem econômica.
O governador Denarium afirmou que o impacto não é apenas nos empresários, mas em toda a cadeia produtiva:
“Qualquer medida que encareça os produtos brasileiros no mercado venezuelano afeta significativamente a competitividade das nossas mercadorias, com impacto direto sobre o agronegócio, a geração de empregos e a arrecadação estadual.”
E agora, o que será das exportações das indústrias brasileiras?
Diante da escalada do impasse, resta saber se o governo brasileiro vai conseguir resolver a questão no campo diplomático. Se não houver um recuo por parte de Maduro, a situação pode gerar desdobramentos não apenas comerciais, mas também políticos, em um momento em que o Palácio do Planalto tem buscado aproximação com regimes latino-americanos.
Mais do que uma disputa comercial, essa decisão da Venezuela coloca à prova a eficiência dos acordos regionais, a capacidade de articulação do governo federal e o grau de confiança entre os países vizinhos.
Resta saber se o governo brasileiro terá disposição e força política para pressionar a Venezuela e proteger os interesses da indústria brasileira. Afinal, diante de um histórico de inadimplência e de novas barreiras comerciais, é essencial que o Brasil busque soluções firmes para proteger seus exportadores e evitar prejuízos acumulados, e o brasileiro acabar ‘pagando duas vezes’.