11/06/2023 às 07h59min - Atualizada em 11/06/2023 às 07h59min
Estudo calcula o nível de destruição florestal em terras indígenas com a fixação do marco temporal.
A estimativa do Ipam é projetada no caso da aprovação do Projeto de Lei que está no Senado para análise e votação. Estudo indica que cerca de 23 milhões a 55 milhões de hectares de áreas nativas sejam desmatados e possam desaparecer.
Um estudo inédito produzido pelo (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) alerta para um potencial de destruição futura da vegetação nativa na Amazônia Legal, abrangendo também parte do Cerrado e Pantanal, caso sejam aprovados o projeto de lei, que restringe a demarcação de terras indígenas, e a fixação do marco temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A estimativa é que entre 23 milhões e 55 milhões de hectares de áreas nativas sejam desmatados e possam desaparecer, resultando na emissão de 7,6 a 18,7 bilhões de toneladas de CO2 (gás carbônico), equivalentes a 5 e 14 anos de emissões do Brasil, ou a 90 e 200 anos de emissões dos processos industriais, respectivamente.
“Além de serem totalmente descabidas à luz da Constituição Federal, que protege o direito dos povos indígenas às suas terras, o projeto de lei e a tese do marco temporal ainda colocarão em risco o equilíbrio climático da região Amazônica, afetando o país como um todo. Podemos dar adeus à meta de desmatamento zero do atual governo e ao compromisso do país em reduzir as emissões de carbono. Nos aproximaremos perigosamente do “ponto sem retorno” que dezenas de cientistas vêm preconizando; estas iniciativas esdrúxulas ameaçam a segurança nacional”, afirmou Paulo Moutinho, pesquisador sênior do Ipam e coordenador do estudo.
Cenários
A análise do Ipam levou em consideração 385 terras indígenas, cujo decreto de homologação foi assinado após a Constituição Federal de 1988. Os pesquisadores levantaram dois cenários para as terras indígenas existentes: grave, com previsão de desmatamento futuro de 20% nas terras indígenas na Amazônia e de 50% para Cerrado e Pantanal; e muito grave, com desmatamento de 50% nas terras indígenas da Amazônia e de 70% para Cerrado e Pantanal.
O avanço da destruição da vegetação nativa, previsto pelo estudo, trará implicações para o regime de chuvas na região, com consequentes alterações nas condições climáticas em todo o país. Os impactos na agricultura, pecuária e geração de energia poderão ser particularmente relevantes. Efeitos das mudanças climáticas em curso já afetam a produção em 28% das áreas agrícolas de soja e milho no centro-oeste brasileiro. Sem adaptação, a porcentagem de agricultura fora do ideal climático no Brasil pode chegar a 50% na próxima década e a 70% em trinta anos. “É preciso entender que respeitar os direitos originários é essencial para todos. Povos indígenas são as raízes da nossa sociedade e seus conhecimentos tradicionais são a base para mantermos o clima equilibrado. Diversos países e cientistas já reconhecem essa importância, agora o Brasil precisa fazer seu dever de casa”, acrescentou Martha Fellows, coordenadora do núcleo de estudos indígenas do Ipam.
Preservação
Terras indígenas ocupam apenas 13% do território nacional e são as categorias fundiárias com as menores taxas de desmatamento (< 2%) da região amazônica, quando comparadas com o desmatamento em áreas privadas (> 30%). Porém, de 2019 a 2021, só na Amazônia, o aumento do desmatamento em terras indígenas foi de 153% em comparação com o triênio anterior. O cenário, causado, sobretudo, pelo aumento da grilagem e do desmatamento ilegal, poderá se agravar se as alterações na legislação sobre os direitos indígenas forem aprovadas.
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, na quarta-feira, pela segunda vez, o julgamento do caso que trata do marco temporal para demarcação de terras indígenas. O ministro André Mendonça pediu vistas do processo. E tem até 90 dias para devolvê-lo. Antes disso, o ministro Alexandre de Moraes votou contra o marco temporal. Com o voto dele, o placar do julgamento está em 2 a 1 contra o marco. Em 2021, o relator Edson Fachin votou contra a tese, e Nunes Marques, a favor.
No entendimento do Moraes, o reconhecimento da posse de terras indígenas independe da existência de um marco temporal baseado na promulgação da Constituição de 1988.
Porém, Moraes votou para garantir aos proprietários que possuem títulos de propriedades localizadas em terras indígenas o direito de indenização integral para desapropriação.
Para o magistrado, existem casos de pessoas que agiram de boa-fé e não tinham conhecimento sobre a existência de indígenas onde habitam.
“Quando reconhecido efetivamente que a terra tradicional é indígena, a indenização deve ser completa. A terra nua e todas benfeitorias. A culpa, omissão, o lapso foi do poder público”, completou. No Congresso
No dia 30 de maio, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 490/07, que trata do marco temporal na demarcação de terras indígenas. Foram 283 votos a favor e 155, contra. A proposta está agora no Senado para análise e votação.