30/11/2023 às 07h24min - Atualizada em 30/11/2023 às 07h24min

Invasão iminente da Venezuela à Guiana?

Prepare-se pois o próximo capítulo da reorganização geopolítica global pode acontecer em breve - e no nosso quintal.

- Por Denis B Minev (Diretor presidente da Bemol)
Aeroporto na região de Essequibo, que Venezuela reivindica da Guiana (Patrick Fort/AFP)
No dia 3 de dezembro, a Venezuela realizará um plebiscito para decidir sobre a anexação do território da Guiana conhecido como Essequibo, uma região notável por riquezas minerais, principalmente o petróleo atualmente explorado por companhias dos Estados Unidos. Essa situação eleva o risco de um conflito armado e ocupação na América do Sul em pleno século XXI.  

Em 2020, a Guiana iniciou a exploração de petróleo, trazendo uma transformação econômica rápida para um país de 804 mil habitantes e renda per capita antes comparável à média africana. Com um PIB que saltou de R$ 4 bilhões em 2015 para R$ 16 bilhões em 2022, a Guiana produz 400 mil barris por dia e se prepara para produzir 1,2 milhões de barris em 2027. Será, então, um dos países mais ricos do mundo.  

Essa ascensão contrasta fortemente com a pobreza na Venezuela, mais rica ainda em reservas de petróleo, criando um provável futuro descontentamento popular e instabilidade para seu governo autoritário. A Guiana, fortalecendo-se economicamente, investirá em defesa nos próximos anos. Para a Venezuela, invadir agora pode ser sua última chance; o tempo não lhe é favorável.  
A dinâmica da Guerra do Peloponeso há 3 mil anos na Grécia, conforme descrita por Tucídides, reflete a situação atual. Naquela época, Esparta, com forte experiência militar mas limitada em crescimento econômico e cultural, observava o crescimento Atenas com desconforto. Atenas expandia rapidamente, fortalecendo sua democracia sob Péricles, construindo muralhas e aumentando sua capacidade naval, incluindo a criação de entrepostos e quasi-colônias no Mediterrâneo. Preocupado com a iminente supremacia ateniense, inclusive militar, Esparta optou por atacar e destruir Atenas. Esse paralelo histórico é notável, especialmente considerando o confronto entre uma democracia em ascensão e um regime tirânico. 

Maduro encara um contexto geopolítico marcado pelo enfraquecimento da Pax Americana instituída pós-1989 (queda do muro de Berlim e fim da União Soviética). A já sancionada economia venezuelana e o baixo custo geopolítico da tomada da Criméia pela Rússia tornam os custos baixos. A retirada desastrosa do Afeganistão, a invasão da Ucrânia pela Rússia e os embates do Irã com o ocidente culminando em Israel, marcam o fim de uma era. Parabéns àqueles que ansiavam pelo fim da hegemonia norte-americana, esperando que um mundo multipolar fosse melhor; vejam se vocês gostam mais dele…

Os aliados da Venezuela chavista – Irã, Rússia, Coréia do Norte, China – todos têm interesse na ocupação da Guiana. Seja por abrir mais uma frente militar aos Estados Unidos, seja pela natural consequência do aumento do preço do petróleo, seja por testar os limites da doutrina Monroe no século XXI. Uma invasão do Essequibo em breve atende a todos.

No caso da China, seus aliados se fortalecem frente a um ocidente exaurido por guerras. Como reagiria o mundo a uma maior assertividade no Mar do Sul da China? Ou em relação a Taiwan? A China também se torna a óbvia compradora do petróleo venezuelano e guianês que o mundo certamente passará a sancionar após a invasão. Por último, em uma eleição nos Estados Unidos entre democratas fragilizados pela inflação e republicanos isolacionistas, é fácil vislumbrar mais espaço para liderança chinesa num mundo onde o poder hegemônico se retira.  

Infelizmente, as circunstâncias atuais são favoráveis para o governo Maduro invadir. Seu exército de mais de 120 mil homens e orçamento militar equivalente a 1 ⁄ 3 do PIB da Guiana deve possibilitar uma conquista em poucos dias de uma área de baixa população (menos de 150 mil pessoas) como o Essequibo. Prepare-se para o próximo capítulo da reorganização geopolítica global, agora no nosso quintal. Temos 1,6 mil quilômetros de fronteira com a Guiana, 90% dos quais são com a área em disputa.  Boa Vista, capital de Roraima, fica a menos de 100 quilômetros da fronteira. 

O que devem o Amazonas e Roraima fazer? O primeiro passo é ter instaladas literais “salas de guerra” para acompanhar a situação, avaliar possíveis consequências e formas de mitigá-las.

É provável, se houver conflito, um fluxo de imigrantes muito intenso dos dois lados. É possível que ajuda humanitária seja necessária – tanto em saúde, dado milhares de feridos em países cujos sistemas de saúde são frágeis, quanto em alimentação, dado que ambos são grandes importadores de alimentos. ONU, Itamaraty, Exército, Cruz Vermelha, Médicos Sem Fronteiras, dentre outros, em breve pousarão aqui? Ainda não é hora de grande mobilização, mas também não deve ser surpresa.

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