O Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF1) negou recurso do Instituto de Terras e Colonização do Estado de Roraima (Iteraima) contra a instauração de inquérito civil pelo Ministério Público Federal (MPF), que visa investigar a transferência de terras em área de fronteira em Roraima. O caso discute a aplicação da Lei 14.004/2020, a qual dispensou o assentimento prévio do Conselho de Defesa Nacional em transferências de terras em faixas de fronteira pertencentes à União.
Representação encaminhada ao MPF denunciou suposta ilegalidade na emissão de títulos de regularização fundiária em faixa de fronteira no estado de Roraima. O órgão ministerial, por sua vez, instaurou inquérito para averiguar a situação, contra o qual, o Iteraima impetrou mandado de segurança. Na primeira instância, o pedido para a suspensão do inquérito foi negado.
Entre as alegações do instituto está a de que representação similar à encaminhada ao MPF foi arquivada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), afastando qualquer ilegalidade na atuação do órgão. O Iteraima argumentou, ainda, que idêntica matéria está submetida ao Supremo Tribunal Federal (STF) por meio da ADI 7052, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultores Familiares (Contag), questionando a transferência e doação de terras de domínio federal para os estados de Roraima, Amapá e Rondônia, sem a observância da correta destinação.
O MPF, no entanto, entende que a dispensa do assentimento prévio do Conselho de Defesa Nacional (CDN), instituída pela Lei 14.004/2020, se limita à transferência de terras da União para o estado de Roraima e do Amapá e não ao procedimento de concessão e alienação de terras localizadas em faixa de fronteira a particulares. Em relação à concessão e alienação de terras de faixa de fronteira, continua válida a Lei 6.634/1979, que estabelece a obrigatoriedade do assentimento prévio do respectivo órgão de segurança nacional.
Embora a questão esteja em discussão perante o STF, tanto a 1ª Vara Federal de Roraima quanto o TRF1, entenderam que não há impedimento para a instauração do inquérito, em respeito à independência entre as instâncias judicial e administrativa, e em razão de ainda não haver decisão judicial com efeito vinculante na mencionada ação.
Em relação ao arquivamento do pedido de providências junto ao CNJ, acerca de títulos emitidos em desacordo com a legislação, dentre os fundamentos, está o de que o pedido foi arquivado por considerar que a questão exorbita a competência do CNJ.
Por fim, ambas as instâncias judiciais manifestaram pela legitimidade da atuação do MPF. “A instauração de inquérito civil público encontra-se inserida nas atribuições institucionais do Ministério Público Federal, ocasião em que o impetrante poderá prestar os esclarecimentos necessários alusivos à sua atuação nos procedimentos de concessão de títulos dominiais em referência, assegurado o exercício do contraditório, do direito de defesa e observado o devido processo legal”, traz a decisão assinada pelo desembargador federal Souza Prudente.
Histórico do caso - Em procedimento preliminar instaurado em 2022, o MPF oficiou ao Conselho de Defesa Nacional, que informou não haver registros de solicitação de assentimento prévio formulado pelo Iteraima relacionado a faixas de fronteira, após a publicação da Lei 14.004/2020.
Posteriormente, o MPF encaminhou recomendação ao Iteraima para que submetesse novos processos de titulação de áreas localizadas em faixas de fronteira no estado ao assentimento prévio do Conselho de Defesa Nacional. Recomendou ainda a revisão de títulos já emitidos relativos às áreas, concedidos, portanto, em flagrante ilegalidade.