05/09/2024 às 08h37min - Atualizada em 05/09/2024 às 08h37min

OPINIÃO: "Cancelamento do julgamento de Antonio Denarium coloca em xeque a idoneidade do TSE"..

- Por: Alexander Ladislau Menezes *

Tribunal Superior Eleitoral (TSE) serve de exemplo para as maiores democracias do planeta por promover – com eficiência, inovação e segurança -, a cada dois anos, eleições em um país de dimensões continentais como o Brasil. Apesar de todos os ataques que vem sofrendo quanto à lisura do nosso sistema eleitoral, a Corte segue firme no seu propósito de garantir transparência, rapidez e absoluto cumprimento das normas constitucionais em cada pleito realizado.

Este ano, mais uma eleição acontece em nosso país, oportunidade na qual serão confirmados os nomes de prefeitos, prefeitas, vereadores e vereadoras que ocuparão os executivos e as câmaras municipais Brasil afora. Novos desafios se apresentam para os ministros e ministras que compõem a Corte Superior Eleitoral. Porém, um desafio se torna urgente e essencial para o pleno funcionamento da nossa democracia: a consolidação do “poder educador” do TSE como garantia da não impunidade nos pleitos eleitorais na política brasileira.

Na pauta de julgamentos do Tribunal Superior Eleitoral, um caso se torna emblemático por vários crimes eleitorais praticados, o chamado “conjunto da obra”: o que pede a cassação do mandato do governador de Roraima, Antonio Denarium, e seu vice, Edilson Damião. Denarium foi cassado por três vezes pelo TRE de Roraima por crimes de abuso de poder político e econômico e abuso de autoridade com desprezo à impessoalidade administrativa. Nas três ações o Ministério Público opinou parecer pela cassação.

No TSE, o julgamento iniciou-se no último dia 13 de agosto, com a leitura do relatório elaborado pela ministra Isabel Gallotti, que detalhou o caso e destacou os princípios do contraditório e da ampla defesa nos argumentos explicitados pelas partes. A apresentação do relatório foi seguida pelas sustentações orais dos advogados de defesa e acusação. Porém, a análise do processo foi suspensa, recolocando-o na pauta do dia 20 de agosto, posteriormente sendo cancelada, mais uma vez, sem justificativas e sem previsão para ser retomada antes do fim das eleições municipais.

Na lista de crimes para serem avaliados pelos ministros e pelas ministras do TSE estão:

1- Abuso do poder político e econômico com distribuição de bens e serviços sem prévia autorização legal específica. Antonio Denarium distribuiu cestas básicas e executou reformas nas casas de eleitores roraimenses, por meio do programa “Morar Melhor”, em 2022, ano de sua reeleição. Desta forma, desrespeitou de forma evidente o parágrafo X, do artigo 73 da Lei n° 9.504/1997 – Lei das Eleições – que diz expressamente: “No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa”.

2 – Abuso de poder político e econômico por meio de transferência de R$ 70 milhões para municípios de Roraima, sem formalização de calamidade e com ausência de vinculação do repasse ao enfrentamento de alegada crise, inobservado as normas de regência com liberação de valores vultosos em parcela única. O governador de Roraima infringiu mais uma vez a Lei n° 9.504/97, desta vez o parágrafo VI do artigo 73, que diz: “Nos três meses que antecedem o pleito fica proibida a transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública”.

3 – Abuso de autoridade com desprezo à impessoalidade administrativa através da promoção pessoal de agentes públicos e aumento de gastos com publicidade institucional, burlando o parágrafo I do artigo 37 da Constituição Federal de 1988 que determina: “A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”. E, ainda, o artigo 74 da Lei 9.504/97, que evidencia: “Configura abuso de autoridade, para os fins do disposto no art. 2 da Lei Complementar n° 64, de 18 de maio de 1990, a infringência do disposto no § 1° do art. 37 da Constituição Federal, ficando o responsável, se candidato, sujeito ao cancelamento do registro ou do diploma”.

Fora do ambiente jurídico eleitoral ainda pairam sobre o governador de Roraima, Antonio Denarium, acusações que vão desde grilagem de terras, garimpo em áreas indígenas até o possível envolvimento no homicídio de dois produtores rurais no Estado. Caso que foi remetido pelo Ministério Público de Roraima à Procuradoria Geral da República em virtude do foro privilegiado do governador. Já em relação à grilagem, investigações apontam interferência junto ao INCRA de Roraima em negativas de títulos definitivos a produtores rurais que vivem e trabalham em suas terras há anos para beneficiar amigos do governador. Existem, ainda, denúncias de participação de familiares de Denarium no garimpo ilegal em terras indígenas. Dados apontam que o garimpo cresceu 3.350% em sua gestão, resultando em graves problemas sociais como abusos sexuais, aliciamento de menores, propagação de doenças entre os indígenas e conflitos por posse de terra.

São inúmeras e robustas todas as denúncias, não havendo como o Tribunal Superior Eleitoral ignorar as evidências de crimes eleitorais praticados por um governador de Estado. O TSE pode fazer história e aplicar o rigor da lei no combate à impunidade política de agentes públicos ou retardar o processo e servir de estímulo ao cometimento de toda espécie de crimes eleitorais para alcançar um cargo público.

A cassação do mandato do governador de Roraima e seu vice pelos crimes eleitorais de abuso de poder político e econômico, em três processos com provas tão inequívocas, dará aos eleitores roraimenses e aos brasileiros a plena confiança na Justiça Eleitoral. Mais do que isso, será um exemplo poderosíssimo para aqueles e aquelas que ousarem burlar as leis eleitorais deste país não se esconderem nunca mais embaixo do “manto da impunidade”.

* Alexander Ladislau Menezes (Alex Ladislau) é advogado especialista em Direito Eleitoral e mestrando em Direito Constitucional pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP). Artigo publicado em Congresso em Foco.

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