O Ministério Público de Contas de Roraima (MPC) protocolou representação junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCER) denunciando possíveis irregularidades na gestão da presidente do Instituto de Terras e Colonização do Estado de Roraima (Iteraima), Dilma Lindalva Pereira da Costa. As suspeitas incluem favorecimento indevido na regularização fundiária da Gleba Baliza, estimada em 904 mil hectares, além da ocorrência de suposta grilagem e prejuízos que podem chegar a R$1,3 bilhão para os cofres públicos.
A ação assinada pelo procurador de Contas Paulo Sérgio Oliveira de Sousa, titular da 1ª Procuradoria, foi motivada após recebimento de denúncia em que aponta que a gestora do Iteraima teria ignorado diretrizes técnicas e legais ao conduzir a regularização da Gleba Baliza, localizada no município de Caroebe, região Sul de Roraima. Dentre os pedidos do MPC está o afastamento da gestora.
Um relatório técnico do Iteraima apontou que a Gleba possui cerca de 904.520 hectares, dos quais 415 mil estão sob domínio do Estado. O documento recomendava a adoção de critérios rigorosos para a regularização fundiária, incluindo a destinação de parte da terra para projetos de colonização e a realização de licitações públicas.
Contudo, a presidente do Iteraima ignorou as orientações e emitiu o Memorando-Circular nº 47/2024, que permitia a concessão de autorização de ocupação sem a necessidade de cumprir todas as exigências legais e mesmo sem o georreferenciamento adequado. Para o MPC/RR, a medida abriu brechas para ocupações irregulares e a consolidação de grilagem na região.
“Mesmo após o Iteraima ter elaborado relatório técnico orientado o cumprimento da Lei n. 976/2024 quanto aos requisitos necessários para regularização e recomendado alternativamente a adoção de outras modalidades de regularização/destinação das terras na Gleba Baliza, a Presidente do Iteraima [Dilma Costa] manteve-se inerte, não apresentando até a presente data qualquer manifestação sobre as orientações e recomendações apresentadas no Relatório Fundiário para a regularização da Gleba Baliza”, destacou o Procurador.
Denúncia aponta indícios de conluio e organização criminosa
A documentação encaminhada pelo MPC revela um possível conluio entre Dilma Costa e o advogado Reginaldo Alencar da Silva, presidente da Associação dos Produtores Rurais do Sudeste de Roraima (PROSERR). Segundo a denúncia, poucos minutos após assinar o memorando, a presidente do Iteraima encaminhou mensagem ao advogado afirmando que o documento "ajudaria nos casos de Caroebe", sugerindo um favorecimento direcionado.
O MPC alertou que a ação pode fazer parte de um esquema criminoso mais amplo, que busca flexibilizar as regras de regularização fundiária para beneficiar ocupações ilegais e legalizar terras públicas de maneira fraudulenta. A revogação de decretos anteriores que estipulavam critérios mais rigorosos para a regularização fundiária reforça a suspeita.
Para Paulo Sousa, a falta de controle e fiscalização rigorosa na regularização fundiária, aliada às possíveis irregularidades apontadas, resulta em graves consequências para a população e o Estado. “A prática de grilagem favorece disputas territoriais que podem culminar em episódios de violência extrema. O caso do casal de agricultores Flávia Guilarducci e Jânio Bonfim de Souza, assassinados no Surrão em decorrência de conflitos fundiários mal resolvidos, é um exemplo alarmante do impacto dessas ações irregulares”, ressaltou.
“Sem segurança jurídica, pequenos produtores, comunidades tradicionais e até mesmo investidores sérios ficam vulneráveis a disputas territoriais, enquanto esquemas de ocupação ilegal continuam proliferando”, complementou.
Ocupação indiscriminada pode causar prejuízos milionários ao Estado
O laudo técnico do Iteraima sugeria a venda pública de 250 mil hectares da Gleba Baliza, o que poderia arrecadar cerca de R$1,3 bilhão. No entanto, segundo o Procurador de Contas, a decisão de conceder autorizações de ocupação de forma indiscriminada impede a arrecadação, causando prejuízos milionários ao Estado.
De acordo com a representação, a prática pode ser caracterizada como grilagem de terras, uma vez que permite a legalização fraudulenta de imóveis por meio de autorizações irregulares, abrindo margem para a posterior comercialização dessas terras por terceiros.
Frente às irregularidades identificadas, o MPC requisitou que o TCE adote medidas urgentes para evitar novos prejuízos e garantir a lisura na regularização fundiária do Estado.
DOS PEDIDOS - Entre os pedidos estão o afastamento imediato da presidente do Iteraima; a suspensão dos efeitos do Memorando-Circular nº 47/2024; a responsabilização da presidente por prevaricação e advocacia administrativa; oitiva do advogado Reginaldo Alencar da Silva para esclarecimentos sobre sua participação no caso; e investigação aprofundada sobre a possível existência de uma organização criminosa voltada para grilagem de terras públicas em Roraima.
A denúncia segue em análise no Tribunal de Contas do Estado, que avaliará as medidas cabíveis diante das acusações. Caso sejam confirmadas as irregularidades, a presidente do Iteraima poderá ser responsabilizada por descumprimento da legislação fundiária e improbidade administrativa.