O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para que não sejam assentados colonos, abertas estradas ou incentivada a exploração dos lotes do Projeto de Assentamento Jatapu, em Caroebe (Roraima), situados em área de sobreposição com a Terra Indígena Trombetas-Mapuera. Além disso, o MPF quer que o Incra providencie, com urgência, o reassentamento dos colonos fixados na área de sobreposição, preferencialmente, em outros lotes de Jatapu.
Segundo a ação, de autoria do procurador da República Alisson Marugal, a terra indígena é habitada de forma permanente e imemorial por grupos originários do chamado complexo cultural Tarumã/Parukoto. Ela se estende pelos estados de Roraima, Amazonas e Pará, e a homologação de sua demarcação se deu em dezembro de 2009. Já a implantação do projeto Jatapu foi iniciada pelo Incra na década de 1980 e o assentamento foi gradualmente expandido.
O MPF esclarece na ação que a região da Terra Indígena Trombetas-Mapuera passou por interdição administrativa da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em novembro de 1987, tendo em vista a possível presença de povos isolados. Mais tarde, no início dos anos 2000, quando foram realizados estudos de campo de identificação e delimitação, percebeu-se existir sobreposição entre a extensão sul do projeto de assentamento e o perímetro da interdição administrativa.
À época dessa constatação, o Incra, a Funai e lideranças Wai Wai chegaram a um acordo: por um lado, o perímetro da interdição administrativa seria redelimitado, de modo a preservar os lotes já ocupados pelo projeto de assentamento Jatapu. Por outro, o Incra excluiria os últimos lotes da vicinal 20, tendo em vista que ainda não tinham sido ocupados por colonos e que ali se localizava uma roça dos índios Karapawyana.
Ocorre que apenas a Funai cumpriu o acordo, limitando a Trombetas-Mapuera à área homologada pelo decreto de dezembro de 2009 e excluindo os lotes já ocupados pelo assentamento Jatapu que estavam sobrepostos à terra indígena. O Incra, por sua vez, além de não excluir os lotes do final da vicinal 20, assentou novos colonos na área nos últimos anos.
Em 2019, em diligência da Funai, foi encontrada uma roça instalada por não indígenas dentro da terra indígena, no fim da vicinal 20. Já em maio de 2020, em nova diligência, a Funai constatou o prolongamento da estrada, o surgimento de várias ocupações de colonos e o desmatamento de 25 hectares com supressão total da vegetação nativa.
Pedidos do MPF na ação - Além de não poder assentar colonos na área de sobreposição com a terra indígena e ter que reassentá-los em outros lotes do projeto Jatapu, o Incra também deve informar os colonos fixados em lotes situados na área da sobreposição quanto à irregularidade de seu assentamento, determinando que não sejam abertos novos pastos e estradas, e que não haja supressão de vegetação.
O Incra também deve declarar a nulidade dos títulos e direitos deferidos a pessoas naturais e jurídicas sobre terras situadas na área da sobreposição, além de promover o georreferenciamento da área do projeto Jatapu e redelimitar sua linha poligonal, de modo a excluir os lotes em interseção com a terra indígena.
O MPF requer ainda que a Justiça condene a autarquia a recuperar as áreas degradadas em decorrência do assentamento indevido e a indenizar os danos intercorrentes, compreendidos como a lesão suportada pela natureza entre os atos degradantes e a sua recuperação.
Além disso, o Incra deve indenizar os danos remanescentes, se verificada a inviabilidade de restabelecer o meio ambiente da terra indígena, no valor de R$ 10.742,00 por hectare, bem como o dano moral coletivo, decorrente do assentamento de colonos em terra indígena e dos prejuízos ao meio ambiente, aos povos indígenas e aos próprios assentados, no valor de R$ 300 mil.