O Tribunal de Justiça de Roraima (TJ) notificou judicialmente o governo de Roraima e a Secretaria de Saúde de Roraima (Sesau) por um novo contrato de R$ 37,7 milhões firmado com um empresário denunciado por desvio de verba pública na pasta. A juíza Daniela Schirato também determinou a imediata suspensão da atividade econômica e financeira da empresa VB Serviços Médicos LTDA, a VB Saúde.
A VB Saúde foi criada há menos de dois anos e está ligada ao procurador da UPMED Farma, Valdan Vieira Barros e Wilson Fernando Basso, esposo da secretária de Saúde, Cecília Lorenzon. A empresa oferta serviços de plantão de seis horas de maneira complementar ao Sistema Único de Saúde (SUS). Valdan Vieira Barros é um dos réus no processo que investiga um rombo de R$ 30 milhões na Sesau através da Cooperativa Brasileira de Serviços Múltiplos de Saúde (Coopebras).
A notificação judicial foi realizada após o Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR) tomar conhecimento de um novo contrato de Barros com a Sesau. “Veio a conhecimento desta promotoria por meio de matérias jornalísticas e mídias sociais, que o réu Valdan Vieira Barros, através da empresa VB Serviços Médicos LTDA retornou a contratar com a Secretária de Saúde, conforme os documentos que seguem em anexo, para que, no mesmo modus operandi analisado nesta ação penal, o réu faça a intermediação entre o Estado e o trabalho fim a ser executado por médicos, a partir do pagamento de plantões, que seguem o mesmo padrão do que aqui se verifica”, relatou o MPRR.
A Justiça Estadual para evitar que se instale o mesmo esquema de desvio de verbas na Sesau, atendeu ao pedido do MPRR. “Assim com o intento de evitar a prática de novas infrações penais, ante os indícios em apuração com a instrução criminal em andamento de que o réu seja integrante de um grupo criminoso voltado à prática de crimes contra a administração pública e que este grupo possa estar em plena atividade, tenho que o Ministério Público trouxe elemento novo apto a ensejar a fixação das medidas cautelares a seguir delineadas”, avaliou a juíza Daniela Schirato.
A medida é cautelar, uma vez que a magistrada, com base em parecer do Ministério Público, entendeu que Barros foi contador da Coopebras e sobrinho do vice-presidente da cooperativa. Isso, segundo o MP, demonstraria claramente a utilização de parentes próximos para a manutenção do esquema criminoso de pagamentos indevidos por meio de plantões. O órgão fiscalizador entende que “permitir o retorno do réu a cena do crime configura o justo receio de sua utilização para a prática de novos rombos aos cofres públicos”.
A juíza do processo ordenou, além da suspensão do contrato, a proibição do sócio de deixar Boa Vista e de contratar com o Poder Público, bem como de obrigar a comunicar à Justiça eventual mudança de endereço. “Não se trata, frise-se, de julgamento antecipado pelos delitos investigados. É que os indícios colhidos durante a investigação permitiram vislumbrar o fumus commissi delicti na prática de delitos contra a administração pública”, disse a juíza.
Com a decisão da magistrada, determinou a suspensão imediata do contrato assinado pelo governo de Roraima e à Secretaria de Saúde. “Comunique-se ao Governo do Estado de Roraima e a Secretaria de Saúde de Estado de Roraima a presente decisão acerca da suspensão da atividade econômica e financeira da empresa VB SERVIÇOS MÉDICOS LTDA (VB SAÚDE) vinculada a contratação com a Secretaria de Saúde de Roraima – SESAU/RR, para providências quanto a imediata suspensão da contratação vigente, observando-se a disposição do inciso I, §3 do art. 137 da Lei n. 14.133/21”, declara o trecho da notificação.
A AGÊNCIA CENARIUM AMAZÔNIA procurou o Governo para posicionamento sobre o assunto. Por meio de nota, disse que recebeu a notificação do Judiciário e que acatará integralmente todas as recomendações apresentadas. Disse também que as atividades vão continuar sendo realizadas conforme a lei.
“A Sesau ressalta ainda que as ações da atual gestão permanecerão sendo realizadas em conformidade com as leis, trabalhando incessantemente para proporcionar um atendimento de excelência e respeito aos direitos de todos os cidadãos e da administração pública.”, complementa.
A reportagem também entrou em contato com a defesa de Valdan Vieira Barros, que optou por não comentar a decisão judicial.
A Justiça de Roraima tornou réus, em setembro de 2020, Valdan Barros e outras oito pessoas que fazem parte da Coopebras por suspeita de organização criminosa, peculato e lavagem de dinheiro em setembro de 2020. O grupo foi denunciado pela suspeita de desvio de ao menos R$ 30 milhões durante anos de contratos para fornecer serviços médicos.
A estimativa de prejuízo foi da Polícia Civil, que deflagrou em agosto de 2020, a terceira fase da Operação Hipócrates, contra o núcleo administrativo da cooperativa. Além de Barros, que ocupava o cargo de gerente da cooperativa, foram denunciados o presidente da empresa, Dimião Weber Zabolostky; o vice-presidente da Coopebras, Edivaldo Pereira Vieira; Esmeralda Menezes Vieiras, esposa de Edivaldo e responsável pelas empresas na Bahia; Maria Oélia Paulino, responsável pelo setor financeiro da Coopebras e Edilson Pereira Vieira responsável pela parte operacional da Coopebras, inclusive as escalas dos médicos.
De acordo com o MPRR, as investigações apontam que Edivaldo Pereira Vieira criou um esquema onde usava outras duas empresas para lavar dinheiro. O órgão pede também reparação dos danos materiais e morais causados pela conduta dos envolvidos e o imediato afastamento dos cargos que ocupam na Coopebras.
A primeira fase da Operação Hipócrates foi em junho de 2019. Na época, a Polícia Civil tinha como foco médicos efetivos que cumpriam jornadas de trabalho simultâneas. Conforme as investigações, os profissionais eram escalados por uma empresa privada para cumprir plantão pelo mesmo horário que eram contratados pelo governo.
A segunda fase da operação, denominada Tracto, foi deflagrada em outubro de 2019. No dia, foram presos em flagrante o vice-presidente da Coopebras e um médico. Os alvos na segunda fase foram agentes públicos que atuavam na saúde pública de Roraima.
Já na terceira fase, a Polícia Civil informou que a Coopebras desviou ao menos R$ 30 milhões da Saúde pública de Roraima durante anos de contratos para fornecer serviços médicos.
Foram expedidos cinco mandados de prisão e cumpridos mais de 40 mandados de busca e apreensão de veículos, além do sequestro de vários imóveis pertencentes ao presidente da Coopebras.