O Ministério da Saúde registrou 363 mortes de indígenas yanomamis em 2023, primeiro ano do governo Lula (PT) e o primeiro ano com ações de emergência em saúde pública no território tradicional, o maior do país. A quantidade de óbitos notificados é superior ao número oficial de 2022, quando foram apontadas 343 mortes, mas profissionais de saúde não comparam os dois anos em razão da subnotificação elevada de casos no último ano do governo Jair Bolsonaro (PL).
A emergência em saúde pública, declarada em 20 de janeiro de 2023, levou a uma maior presença de profissionais no território, com maior identificação de casos. Mesmo assim, o número elevado de mortes, a persistência dos casos de desnutrição grave –incorporada à rotina de crianças em diferentes pontos do território– e a explosão de casos de malária, com surtos sucessivos, dimensionam a gravidade e a persistência da crise humanitária enfrentada pelos yanomamis.
Dados sistematizados por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação) apontaram a ocorrência de 345 óbitos na terra indígena em 2023. Esses dados foram extraídos do sistema de notificações –o Sistema de Atenção à Saúde Indígena– em 20 de dezembro de 2023. Estão, portanto, incompletos.
O Ministério da Saúde deve publicar nesta quinta-feira (22) o boletim com atualização do detalhamento das mortes e incidências de doenças no território, um relatório feito pelo COE (Centro de Operação de Emergências) Yanomami, vinculado à pasta. Nesse documento, o número de óbitos a ser informado será 363, segundo integrantes do governo.
boletim mais recente traz dados até 30 de novembro. Conforme esse relatório, 308 yanomamis –ou indígenas de outros subgrupos na região– morreram até a data. Mais da metade dos óbitos foi de crianças de até quatro anos. Entre as causas principais das mortes estão pneumonia, diarreia, malária e desnutrição. Os casos de malária somam mais de 25 mil.
"Todos os números são preliminares e estão sendo investigados pela Sesai [Secretaria de Saúde Indígena]", afirma Weibe Tapeba, secretário de Saúde Indígena. Segundo ele, havia precarização de serviços e subnotificação de dados em 2022 e nos anos anteriores, o que impediria uma análise "conclusiva" sobre as notificações.
"Há diferença também entre a data do óbito e a notificação no sistema, pelas dificuldades de acesso ao território", disse Tapeba. "Há busca ativa para identificar mortes e doenças não notificados na última gestão." Um inquérito em saúde indígena é conduzido por Sesai e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), e os números dos anos anteriores –inclusive 2023– podem sofrer alterações, conforme o secretário do Ministério da Saúde.
Tapeba disse ainda que o território tem, hoje, 40% a mais de profissionais de saúde, em comparação com 2022. Ele admitiu que o atendimento de saúde ainda não chega a comunidades em razão da permanência da exploração ilegal de ouro. Não há segurança mínima para equipes de saúde. Os yanomamis vivem uma crise humanitária em razão da invasão de garimpeiros em seu território. Até 2022, auge da invasão, eram 20 mil garimpeiros, estimulados pelo governo passado.
No começo de 2023, o governo Lula deu início a uma operação para retirada dos invasores, ao mesmo tempo em que ocorriam as ações de emergência em saúde. A quantidade de áreas invadidas diminuiu no primeiro semestre, assim como a quantidade de garimpeiros em ação no território. A partir de setembro, ações de fiscalização foram abandonadas, e as Forças Armadas se ausentaram das atribuições de repressão ao garimpo. Houve um novo avanço da exploração ilegal de ouro, ainda que em escala menor, com reflexo direto na saúde dos indígenas.
A desnutrição persiste em comunidades das regiões de Auaris e Surucucu, onde o Exército tem PEFs (pelotões especiais de fronteira). Os surtos de malária são frequentes, e profissionais de saúde consideram que todos os indígenas de Auaris –a região mais distante, colada na Venezuela– contraíram malária em 2023.
Em comunidades como Kayanaú, onde o posto de saúde seguia fechado em meados de janeiro, o garimpo se intensificou e tornou impossível a ação de profissionais de saúde, que desconheciam o destino e as condições de saúde de mais de 300 yanomamis que viviam em cinco aldeias da região. O governo federal anunciou a presença de uma "casa de governo" em Roraima para tratar das ações na terra yanomami e a instalação de três bases de vigilância no território, com forças de segurança como PF (Polícia Federal) e Forças Armadas. Os gastos previstos são de R$ 1,2 bilhão.